Remédio de marca e genérico é tudo igual?

Texto publicado em 19 de abril de 2025

Entre médicos, especialmente psiquiatras, é comum ouvir que os medicamentos referência funcionam melhor do que os genéricos ou similares. Essa percepção, no entanto, não é sustentada por evidências sólidas e pode reforçar escolhas menos acessíveis do ponto de vista econômico. Por outro lado, também não é adequado afirmar que essas formulações sejam idênticas.

Antes de seguir, vale esclarecer os termos. Medicamento referência é o produto original, desenvolvido por um laboratório que realizou os estudos clínicos e obteve o registro inicial (patente). Genérico é uma cópia com o mesmo princípio ativo do medicamento referência, mas sem nome comercial e com preço mais acessível. Similar também tem o mesmo princípio ativo, mas é vendido com outro nome comercial.

Para tornar mais concreta essa distinção, podemos usar o antidepressivo escitalopram como exemplo. O medicamento referência é o Lexapro®, desenvolvido pelo laboratório Lundbeck. Entre os genéricos disponíveis, há diversas opções vendidas apenas sob o rótulo do princípio ativo (oxalato de escitalopram). Já os medicamentos similares são vendidos com nomes comerciais próprios. Exemplos incluem Exodus® (Aché), Reconter® (Libbs), Espran® (Torrent), Escilex® (EMS) e Escena® (Eurofarma).

No Brasil, tanto genéricos quanto similares intercambiáveis precisam passar por testes que demonstrem a bioequivalência com o medicamento referência. Isso significa que, ao serem ingeridos, devem liberar o princípio ativo na corrente sanguínea na mesma velocidade e na mesma quantidade. A Anvisa permite uma faixa de variação que geralmente não leva a um impacto clínico significativo.

Contudo, em alguns casos específicos, pequenas variações podem gerar consequências relevantes, como por exemplo no uso de anticonvulsivantes em pacientes com epilepsia, em que pequenas alterações na concentração sanguínea podem comprometer o controle das crises. Por isso, quando um paciente se adapta bem a determinada marca ou fabricante, pode ser recomendável mantê-la para evitar variações na resposta individual. Isso não significa, contudo, que os demais produtos sejam inferiores.

Quando pensamos especificamente em tratamentos psiquiátricos, principalmente para os quadros mais prevalentes, discretas variações nas concentrações dos fármacos no organismo não são clinicamente tão impactantes quanto outros aspectos como a adesão ao tratamento. A suposta superioridade dos medicamentos referência percebida por médicos e pacientes talvez possa ser explicada por fatores psicológicos. Transtornos mentais têm um curso flutuante, com oscilações naturais dos sintomas, o que pode levar a alterações clínicas que não estão relacionadas a mudanças de medicação, mas são assim interpretadas. O viés de confirmação também interfere: tendemos a perceber mais facilmente os efeitos que confirmam nossas expectativas. Além disso, há o efeito placebo, quando a confiança no tratamento intensifica seus efeitos, e o efeito nocebo, quando a desconfiança aumenta os efeitos colaterais e prejuízos identificados.

Podemos levar em conta, ainda, um argumento comercial. Laboratórios farmacêuticos dependem diretamente da eficácia percebida pelos pacientes. Se um remédio não funciona tão bem, existe maior chance do paciente abandonar o tratamento. Fabricar um medicamento que não entrega resultado é, do ponto de vista econômico, um erro estratégico que mina a sustentabilidade do próprio negócio. Assim, não é verossímil supor que uma indústria farmacêutica tenha interesse em comercializar medicamentos com dose ou absorção errática, embora seja possível que em algumas ocasiões ocorram falhas no controle de qualidade.

Diante de tudo isso, embora para alguns casos seja recomendável cautela ao trocar a marca do medicamento, o mais importante é lembrar que genéricos e similares são regulamentados, testados e, geralmente, oferecem a mesma eficácia do produto de referência, com um custo muito menor. Em saúde mental, garantir o acesso e a continuidade do tratamento é mais importante do que a marca estampada na caixa.